Representantes do governo e do setor produtivo defenderam nesta quarta-feira (22) medidas para derrubar barreiras protecionistas impostas a produtos brasileiros no exterior. Eles participaram de audiência pública da Comissão de Meio Ambiente (CMA) para discutir o projeto de lei da reciprocidade ambiental (PL) 2.088/2023 .
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), relatora do projeto, sugeriu a audiência pública. Ela destacou que, a partir de 2025, a União Europeia pretende impor restrições a produtos como soja, carne bovina, madeira, cacau, café, borracha e óleo de palma que tenham origem em áreas desmatadas após dezembro de 2020. Para a parlamentar, as exigências ambientais são “totalmente descabidas”.
— O problema é que, para a União Europeia, não importa se a supressão vegetal é legal, feita com autorização, ou ilegal. Eles ignoram ou desconhecem completamente o exigente Código Florestal Brasileiro [ Lei 12.651, de 2012 ], que determina a proteção de 20% a 80% da vegetação nativa em uma área rural, a depender do bioma. São exigências ambientais totalmente descabidas, que na verdade escondem barreiras comerciais contra nós — disse.
Para o autor do PL 2.088/2023, senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), as exigências ambientais feitas ao Brasil são abusivas. Ele destacou que a União Europeia não adota as mesmas restrições a países que desmataram e poluem mais do que o Brasil.
— O cliente sempre tem razão, mas não podemos ficar sentados numa mesa só recebendo ordens. O projeto de lei, no fundo, no fundo, quer levantar um debate. Tentar fazer com que esse país seja um país. A questão ambiental é global. Não adianta eu estar aqui me matando, e o outro ali ferrando com todo mundo. Por que não vão impor à China e aos americanos a mesma coisa? — questionou.
A audiência pública contou com a presença da secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Tatiana Prazeres. Ela reconhece que houve “uma multiplicação de restrições ao comercio, adotadas por motivos ambientais”. Mas adverte que a reposta brasileira não deve ser radical.
— Estamos preocupados com o protecionismo verde. Com a possibilidade de os países utilizarem um argumento que é legítimo como desculpa para restringir o mercado ou para conceder subsídios que distorcem o mercado internacional. Mas como responder sem que aquilo prejudique os próprios interesses nacionais? A calibragem, a sintonia fina e a definição de parâmetros devem balizar a legislação. Talvez restringir importações que não cumprem padrões equivalentes ao do Brasil, mas não necessariamente proibir essa importações — sugeriu.
A subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda, Cristina Reis, reforçou o argumento. Para ela, a resposta brasileira não pode funcionar como uma Lei de Talião.
— Quando a estratégia do “olho por olho, dente por dente” é adotada, em qualquer aspecto, ela é muito perigosa. No limite, ela pode levar à destruição de ambos os lados. Se um se vinga, e o outro se vinga de volta, aonde vamos? A busca do diálogo e do consenso é fundamental. Pelo que vi do projeto de lei, a retaliação é muito direta e geral. Precisamos de muitos insumos importados para nossa produção local, seja do agro ou de outros setores. No limite, isso poderia prejudicar ambos os lados — argumentou.
O coordenador de Mudanças do Clima e Desenvolvimento Sustentável do Ministério da Agricultura, Adriano Santhiago, disse que o agronegócio registrou a menor taxa de crescimento na emissão de gases de efeito estufa entre 2005 e 2020. Enquanto setores como energia, indústria e resíduos registraram índices de 24%, 23% e 35%, respectivamente, o segmento rural registrou 7%.
— O setor agropecuário vem sendo às vezes agredido externamente e muitas vezes por pessoas aqui no Brasil, pautadas por interesses externos. Mas a gente mostra com números que não é bem assim. A gente tem condições de questionar. Impor ao Brasil uma restrição comercial não tarifária não condiz com o que a gente vem fazendo — disse.
O diretor do Departamento de Política Comercial do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Fernando Meirelles de Azevedo Pimentel, avalia que o comércio internacional assiste a “uma proliferação de medidas econômicas unilaterais com justificativa ambiental”. Para ele, o Brasil precisa “desenhar mecanismos capazes de equiparar as condições de concorrência”.
— A produção nacional é mais verde e mais sustentável do que grande parte da produção de nossos concorrentes, seja na indústria ou na agricultura. É preciso mitigar distorções e prejuízos causados por medidas unilaterais no mercados para onde a gente exporta — afirmou.
Consultor de meio ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rodrigo Justus de Brito disse que os produtores rurais europeus não são obrigados a cumprir as mesmas regras ambientais impostas aos brasileiros. Ele criticou a falta de reciprocidade no tratamento dispensado a setor.
— Não há reciprocidade alguma da Europa. Não podemos nos calar e ficar assistindo a esse show de barreiras comerciais não tarifárias, arrogância e hipocrisia. Não podemos aceitar isso como se estivéssemos levando um sermão da vovó como quando éramos crianças e fazíamos alguma bobagem — comparou.
Para o diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Soja, Fabrício Morais Rosa, o PL 2.088/2023 pode ser “uma ferramenta para coibir os abusos”.
— Esses países usam mais áreas do que o Brasil para a agricultura, não possuem preservação ambiental, têm uma matriz energética pior do que a brasileira. Mas querem exigir regras para o Brasil acima do nosso Código Florestal. Isso não podemos admitir. Do ponto de vista ambiental, é um abuso, uma discriminação — avaliou.
Parlamentares criticaram as medidas protecionistas de caráter ambiental impostas ao Brasil. O senador Esperidião Amin (PP-SC) classificou as barreiras como “armadilhas”.
— O comércio exterior tem armadilhas e interesses, que justificam os ardis e a criação de narrativas. Não somos tão ingênuos assim para não perceber que boa parte dessas narrativas, desses artigos científicos pré-fabricados, tem como origem, além dos interesses, o remorso. Muitos desses países que nos recriminam têm um profundo remorso pelo que fizeram. A grande esperteza que está sendo inventada é que o remorso é deles, mas eles querem descarregar a penitência só para nós. É a terceirização da penitência — comparou.
O senador Omar Aziz (PSD-AM) criticou “algumas pessoas do governo brasileiro” que, segundo ele, não questionam as barreiras comerciais feitas ao país.
— Não temos culpa de absolutamente nada do que está acontecendo no mundo. A China emite mais 30% do CO2do mundo. Mais de 20% são dos Estados Unidos. França, Inglaterra e União Europeia emitem mais do que o Brasil. Mas nós temos que nos curvar a isso? Não tem lógica. É impressionante como algumas pessoas do governo fazem questão de amarrar o Brasil e fazem política para aparecer no exterior, e nós aqui sofrendo por uma coisa que não temos culpa — disse.
O senador Jayme Campos (União-MT) reforçou a crítica.
— O negócio é comercial. A verdade é essa. O que é triste é que alguns cidadãos deste país são contra o povo brasileiro, falando aquilo que não retrata a verdade em relação ao produtor. O governo teria o papel de nos defender, mas, lamentavelmente, é o próprio governo contra a sociedade brasileira. Não podemos ficar de quatro para quem quer se seja. Temos que defende nossa soberania — afirmou.
O senador Confúcio Moura (MDB-RO) criticou o projeto de lei. Para ele, a matéria promove reserva de mercado e não teria efetividade, se fosse transformado em lei.
— Estou aqui para divergir. Vejo o projeto como uma reserva de mercado, e isso nunca funcionou em lugar nenhum. Já aconteceu na área de tecnologia: quiseram proteger o Brasil e deu no que deu. Um “atrasão” brutal, que até hoje a gente está aí capengando. Vamos supor que essa lei seja aprovada. Qual é o resultado prático? Será que vamos deixar de importar as vacinas que não produzimos aqui? E os remédios, que vêm todos de fora? O projeto de lei tem uma boa intenção, mas é completamente inócuo — avaliou.
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