Especialistas em meio ambiente ouvidos em audiência pública daComissão de Direitos Humanos (CDH)nessasegunda-feira (13)associaram o agravamento dos eventos climáticos extremos à exploração econômica dos biomas e cobraram a formulação de políticas públicas de enfrentamento às mudanças no clima com maior protagonismo das populações mais atingidas em seus direitos fundamentais.
Representando o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia(Ipam Amazônia), Ane Alencar apresentou dados sobre a vulnerabilidade do bioma amazônico à ação humana, especialmentepor incêndios induzidos.Ela citou que, apesar de a presente situação de estiagem favorecer as queimadas, houve uma redução importante do desmatamento em relação ao ano passado — ainda assim, são grandes osimpactos das queimadas sobre a qualidade do ar e da saúde,pontuou.
— As consequências são enormes para o meio ambiente, mas principalmente para as pessoas que estão sem água boa para beber, sem comida, sem transporte e expostas a todo tipo de doenças.
Aprefeita de Jandaíra (RN), Marina Dias Marinho, mencionou os benefícios econômicos e sociais da geração eólica na Caatinga, mas lamentou a falta de atenção sobre o impacto negativo da expansão dessa atividade.Lembrando que seu município tem o número “alarmante” de um aerogerador por 70 habitantes, ela citou consequênciasda atividade energéticaque incluem desmatamento de áreas conservadas, ameaça às abelhas nativas, supervalorização imobiliária, prostituição e gravidez precoce,e cobrou um modelo descentralizado de diálogo com a sociedade civil.
— Não adianta a gente ter um novo meio de produzir energia que tenha uma fonte não fóssil se continua causando os mesmos impactos sociais e ambientais de outros meios —protestou.
Gabriel Mantelli, representante da Conectas Direitos Humanos,sugeriu que otemapasse a serabordado a partir de um conceito amplo de “crise climática”,reforçandoo papel do Estadoem seu enfrentamento econferindo mais protagonismoàspopulações negra, indígena e de povos e comunidades tradicionais.
— No contexto brasileiro, as pessoas mais vulnerabilizadas pela crise climática são as pessoas que historicamente passam por um processo de marginalização social —afirmou.
A representante da ONG Environmental Justice Foundation Brazil (EJF) na área de biodiversidade e clima,Luciana Leite, citou a recorrência das queimadas e da perda de biodiversidade no Pantanal,situação que,de acordo com os dados que mostrou,faz surgir “refugiados climáticos” nobioma.Ela destacou a relevância da pecuária no Pantanal, atividade que associou atrabalho análogoàescravidão e migração forçada,e cobrou fiscalização epunição às empresasenvolvidasnessa cadeiaprodutiva.
— Infelizmente, a gente sabe que, hoje, a pecuária no Brasil é não apenas a atividade econômica que mais desmata, mas a atividade econômica que mais escraviza.
Osenador Wellington Fagundes (PL-MT), por videoconferência, concordou com a palestrante, citando a situação “extremamente hostil” do clima em seu estado, e saudou a importância do diálogo entre a União e o governo estadual para as ações de combate ao fogo.
— Não adianta ficar brigando pelo protagonismo ou por quem tem obrigação ou não: o certo é que, neste momento, o Pantanal é um patrimônio da Humanidade que cabe a todos nós.
Secretaria Executiva do Observatório dos Conflitos Socioambientais do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), Juliana Mirandavinculoua expansão da fronteira agrícola no Cerradocoma ocorrência deproblemas como aumento do desmatamento, concentração fundiária,elevada desigualdade social e violações de direitos humanos das populações daregião.
—A expansão dessa fronteira agrícola gera violações e conflitos como degradação de nascentes e leitos dos rios, poluição de nossas águas devido ao uso intensivo de agrotóxicos, destruição da flora e da fauna do Cerrado; tudo isso tendo rebatimento muito óbvio no direito à saúde, à educação e à segurança alimentar e nutricional de povos e comunidades tradicionais.
Coordenador-executivo do Comitê dos Povos e Comunidades Tradicionais do Pampa, Fernando Aristimunho salientou a necessidade de reconhecimento epolíticas afirmativas a favor decomunidades — entre as quais, ciganos, quilombolas, pescadores artesanais e pecuaristas familiares — que historicamente são as mais prejudicadas pelos eventos climáticos extremos e têm seus territórios mais ameaçados pela expansão da fronteira agrícola.
—A gente precisa fazer esse debate chegar às comunidades tradicionais nas diferentes regiões do bioma Pampa (...). É preciso haver espaços de diálogo locais.
Tratando da mata Atlântica, o representante do Instituto MapBiomas, Marcos Reis Rosa, mencionou dados históricos que demonstram uma relativa estabilidade na preservação do que resta do bioma, masapontou os riscos da expansão urbana sobre a vegetação.
— Estamos falando também do crescimento de favelas ou de comunidades onde não há uma estrutura, e é a primeira área que vaisofrer com mudanças climáticas e eventos extremos.
O presidente da CDH e da audiência pública, senador Paulo Paim (PT-RS), se disse animado com as propostas apresentadas e pela disposição de “construção coletiva”.
— Temos que combater todo o ataque que tem ao clima, temos que ver o que existe, qual a política de transição aceitável, mas dialogando com as pessoas que estão na área.
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