A Câmara Legislativa realizou audiência pública, nesta sexta-feira (12), para debater os resultados da pesquisa “Violências Vivenciadas por Adolescentes em Espaços Educativos e na Socioeducação do Distrito Federal”, do Observatório de Violência e Socioeducação do Distrito Federal (Oves/DF). O trabalho revela o perfil dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas no DF – sejam elas com privação de liberdade ou em meio aberto – e analisa o fator “Educação” antes do cometimento do ato infracional e dentro do sistema.
A iniciativa do debate partiu do presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Casa, deputado Fábio Felix (PSOL), que é assistente social e trabalhou em quatro unidades de internação de adolescentes em conflito com a lei. O parlamentar acredita que o trabalho do Observatório pode melhorar a execução das políticas públicas voltadas para esses meninos e meninas.
Mas, afinal, quem são esses adolescentes? Um dos pesquisadores do Oves/DF, Thiago Bazzi apresentou as principais “marcas de vulnerabilidade social” dos que se encontram no sistema socioeducativo do Distrito Federal, partindo da análise de dados da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus/DF), entre os anos de 2019 e 2022.
O levantamento aponta que 90% dos que entram no sistema socioeducativo são negros; 94% são do gênero masculino; 95% têm renda familiar de até três salários mínimos; 48,79% moram com a mãe/madrasta e irmãos, e 59% não estão na escola (não matriculados, infrequentes ou evadidos).
Além disso, dos adolescentes em conflito com a lei, 40,99% estavam na Educação de Jovens e Adultos (EJA), e 39,69% nos anos finais do ensino fundamental. Se forem considerados apenas aqueles cumprindo medidas socioeducativas, 68,60% estavam concluindo o ensino fundamental.
“É preciso pensar como o fator ‘educação’ interfere na entrada, no cometimento do ato infracional, e como a educação pode ser uma alternativa de saída desse universo”, avalia Bazzi.
A professora emérita da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora do Observatório, Maria Lúcia Pinto Leal, defende ser importante “trazer a escola para construir novos modelos de participação, inclusão e projeto de vida dos que estão vivenciando medidas socioeducativas, sobretudo na liberdade assistida, onde o nível de evasão escolar é muito grande”.
Considerando outros aspectos revelados pela pesquisa, especialmente o recorte racial, a estudiosa convida à reflexão: “Como construir uma relação potente entre escola e socioeducação que leve a novas formas de pensar as práticas do atendimento e da atenção nas medidas socioeducativas que não sejam pautadas pela tutela e pelo racismo?”.
Para Paulo Balsamão, defensor público do Núcleo de Execução de Medidas Socioeducativas da Defensoria Pública do Distrito Federal, a falta de suporte da Educação e da Assistência Social para as famílias em situação de vulnerabilidade está no cerne do problema do cometimento de ato infracional. “Quanto custa o resgate de uma desigualdade social? Essa é uma despesa que o governo precisa fazer”, defendeu.
O subsecretário do Sistema Socioeducativo da Sejus/DF, Daniel Fernandes Silva Felix, destacou que pesquisas como a realizada pelo Oves são fundamentais para uma política pública eficaz: “Fornecem os dados e os nortes”. E acrescentou: “Aqui somos matéria-prima e destinatário dessa pesquisa”.
A audiência desta manhã contou ainda com outras autoridades, representantes da Academia e da sociedade civil organizada, e servidores do sistema socioeducativo. O adolescente João Henrique dos Santos, que cumpre medida de semiliberdade na Metropolitana, também acompanhou o debate.
Saiba mais
A pesquisa “Violências Vivenciadas por Adolescentes em Espaços Educativos e na Socioeducação do Distrito Federal” foi realizada pelo Oves/DF por meio de uma parceria entre o Grupo Violes/SER/UnB, a organização Transforme – Ações Sociais e Humanitárias e a Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania, com recursos de emenda parlamentar do deputado Fábio Felix.
A iniciativa envolveu, além da análise de dados quantitativos, análises qualitativas. Entrevistas aos adolescentes e oficinas foram realizadas para dar visibilidade às trajetórias desses garotos e garotas. O material resultou num documentário, que pode ser visto aqui .
O relatório da pesquisa está disponível, na íntegra, no site do Oves/DF .
Denise Caputo/ Agência CLDF